Um breve relato sobre o jornalista Mário Filho

                             Um encontro de gigantes: o jornalista Mário Filho e o maior jogador de todos os tempos, Pelé


Jornalista Mário Filho foi mais criativo que seu irmão Nelson Rodrigues

Desconhecido da população em geral — mesmo do Rio de Janeiro —, ele revolucionou a imprensa esportiva, lutou pela construção do Maracanã e idealizou o desfile das escolas de samba. Mário Filho foi um dos maiores agitadores culturais do Rio de Janeiro na primeira metade do século passado.

Estádio Mário Filho. tos no País identificariam rapidamente de qual logradouro se estaria falando, apenas com essa informação? O nome é homenagem justíssima à pessoa sem a qual, provavelmente, a obra não seria erguida, por ferir outros interesses políticos. E o Rio de Janeiro não teria, então, um de seus símbolos, o Maracanã.

Mário Rodrigues Filho foi uma das personalidades mais ativas e criativas da cena carioca da primeira metade do século e mesmo assim, em um país sem memória, não se encontra facilmente quem o reconheça. E entre os que têm esse mérito, boa parte o conhece como “o irmão de Nelson Rodrigues”. Mário foi muito mais do que isso, como jornalista, agitador cultural, escritor, pesquisador e ativista.

Não há nenhum exagero em afirmar que Mário Filho foi muito mais importante para o legado jornalístico e cultural do Brasil do que seu irmão, Nelson Rodrigues, um gênio explicitador das bizarrices mais ocultas do ser humano e um cronista esportivo dotado de um lirismo fundador na linguagem do futebol — são deles frases como “O Fla-Flu surgiu 40 minutos antes do nada”.


Mas Nelson não fazia muito mais do que escrever, embora nesse quesito fosse difícil de ser superado na própria família. Entretanto, se seu irmão era mais genial no que dizia respeito aos textos, Mário Filho, além de escrever, inovava sempre: foi por meio dele que a cobertura de futebol deixou de ser uma nota perdida — quando existia tal nota — em algum canto do jornal para virar uma editoria.

Tudo começou em “A Crítica”, de seu pai. Conta Mário Neto, também jornalista, que seu avô certa vez deixou o fechamento do jornal para Mário Filho. Sem notícias para completar a primeira página, ele colocou uma reportagem sobre um jogo entre Flamengo e Vasco, que aconteceria nas Laranjeiras. Mário Rodrigues, o pai, que tinha certa ojeriza ao futebol, ficou enfurecido com a decisão do filho. Só que, no dia seguinte, não restou um exemplar nas bancas.

Foi assim que Mário inventou o jornalismo esportivo no Brasil. Dedicava páginas inteiras ao futebol, esporte marginalizado, embora popular. Para se aproximar dos leitores que gostavam da modalidade (e conquistar outros, obviamente), ele mudou a forma da escrita, descrevendo os jogos com uma linguagem mais acessível. Em uma época em que não havia TV, as pessoas compravam o jornal para imaginar como teria sido o lance do gol, nas linhas dos textos. A escola é seguida até hoje por muitas publicações impressas, embora esteja, hoje sim, anacrônica — com dezenas de câmeras, replays e internet disponíveis, é uma forma de escrever que merece ser restringida pelos repórteres esportivos da área de impressos.

Ao mesmo tempo, ele sacolejava a vida da Cidade Maravilhosa com ideias as mais diversas. O dono do nome do Maracanã é também o inventor do desfile das escolas de samba, o “maior espetáculo da terra” que toma conta da Marquês de Sapucaí a cada ano. Foi em 1932, quando em “O Mundo Sportivo” — o primeiro jornal especializado apenas em esportes no Brasil — lançou o Concurso de Escolas de Samba.

No “Jornal dos Sports” — que havia comprado de Roberto Marinho — Mário criou os Jogos da Primavera (1947) e os Jogos Infantis (1951), além do Torneio de Pelada no Aterro do Flamengo e o Torneio Rio-São Paulo, que se tornaria, anos mais tarde, o atual Campeonato Brasileiro e acabaria tendo seus ganhadores reconhecidos como campeões nacionais pela Confederação Brasileira de Futebol, o que somente ocorreu recentemente.

No fim da década de 1940, o envolvimento de Mário Filho com causas esportivas se embaralhou com questões políticas semelhantes às que o País vive agora, diante da Copa do Mundo de 2014: o jornalista travou, por meio dos veículos de comunicação, uma batalha contra o então vereador — e provavelmente já verborrágico — Carlos Lacerda. O Rio vivia os preparativos para a Copa do Mundo de 1950 e Lacerda queria a construção de um estádio municipal em Jacarepaguá para receber os jogos. Mário convenceu os cariocas a levantar o novo estádio — o maior do Rio, até então, era São Januário, de propriedade do Vasco — no bairro do Maracanã, onde antes havia um terreno do Derby Club. Ao contrário do que queria Lacerda, Mário vislumbrava o maior estádio do mundo.

Um capítulo à parte da história de Mário Filho é o livro “O Negro no Futebol Brasileiro”, obra que o sociólogo e antropólogo Gilberto Freyre, amigo pessoal do jornalista, considerou uma visão identitária da realidade brasileira a partir do futebol. Um clássico da literatura nacional que vai muito além das quatro linhas. Mas a publicação — com histórias deliciosas de personagens da cena futebolística da primeira metade do século passado — merece um capítulo à parte. No caso, uma boa resenha.

Mário morreu aos 58 anos, em 1966, poucos meses após o maior fracasso do Brasil em Copas do Mundo, mesmo com Pelé em campo. Sofreu um ataque cardíaco. Meses depois Célia, sua mulher e paixão de toda uma vida — casaram-se quando ele tinha 18 anos —, se matou. Uma história que acabou por tomar contornos de drama rodriguiano. Para homenagear o irmão, Nelson Rodrigues, um dos maiores frasistas da língua portuguesa, cunhou a expressão “O criador de multidões”, em alusão à importância de Mário Filho na popularização do futebol e do carnaval. E sentenciou, por fim: “Mário Filho foi tão grande que deveria ser enterrado no Maracanã.”

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